sexta-feira, 18 de julho de 2008

O choro amargo na hora do adeus à voz que deixa saudade


O choro amargo na hora do adeus à voz que deixa saudade






Luanda, 17/07 – A morte por doença do músico angolano Alberto Teta Lando, tornada pública segunda-feira, voltou a "mergulhar" o país num incontido clima de amargura, dor e luto, sentimentos que, mesmo juntos, não espelham a dimensão da perda de um homem nobre, cuja voz transcendeu as fronteiras de África.

Tal como sucedeu por altura do desaparecimento físico da cantora Lourdes Van-Dunen (2006), Angola torceu, pediu aos céus e acreditou firmemente que nem um maligno cancro tivesse força para roubar, prematuramente, o fôlego sagrado a um dos mais persistentes defensores da cultura genuína dessa jovem nação.

O querer, a força, a típica fé africana e a energia positiva de quase 14 milhões de compatriotas chegaram à capital francesa, Paris, mas nada, nem ninguém conseguiu evitar o inevitável: a partida e o adeus de uma voz que já deixa saudades.

Teta Lando simboliza as raízes africanas, a dor de um povo que durante cinco séculos viu-se transformado, "roubado" e ludibriado em relação às suas verdadeiras matrizes culturais, às quais procurou sempre valorizar com destemor e nostálgicas letras, inspiradas na realidade dos seus ancestrais.

Com a sua partida, a cultura nacional sofre um duro golpe, que põe o país em lágrimas e sem um dos seus mais valiosos intérpretes, de quem recebeu, durante 46 anos, um incontestável contributo na luta pela afirmação da unidade territorial.

É, pois, um facto que partiu uma voz, um pesquisador, um valoroso guerrilheiro que, sem armas nas mãos, intercedeu sempre, quer no exílio, quer na terra mãe, a favor do bem estar da nação, da valorização e projecção dos traços culturais angolanos.

A hora é de amargura, sofrimento e reflexão, mas fica, desde já, a certeza de que, jamais, a obra desse ilustre compositor passará longe dos ouvidos e da memória colectiva do povo angolano, de quem se espera, agora, sabedoria para projectar a cultura nacional à luz dos ensinamentos daquele ilustre formador de consciências.

Chorar, em sua memória, será só um passo minúsculo e incapaz de retribuir o esforço e a vida de um "profético" homem de música, que durante quatro décadas soube mostrar à África e à Europa os anseios, as aspirações, convicções e, no geral, a diversidade cultural de Angola, particularmente dos povos oriundos da região norte.

Teta Lando partiu, deixando o tão ansiado país livre e independente que musicou em "Angolano Segue em Frente", mas, mesmo à distância, quererá ver um povo unido, trilhando por um caminho justo que dar-lhe-á "felicidade e a liberdade" ideológica.

Lutador incansável, o músico vê agora "roubada" a chance de voltar a olhar o rosto dos irmãos das sanzalas do norte, como prometera na canção "Eu Vou Voltar", bem como a oportunidade de evocar o "Desportivo de São Paulo" e a "Maria das Crequenhas".

A espera do povo é agora eterna, infinita (...), já que Teta Lando não mais pode pisar o lugar onde nasceu, cresceu, brincou e magoou-se, assim como deixará de observar os caminhos por onde tantas vezes passou, o matagal onde viu seu pai morrer, o lugar onde a mãe dos seus filhos namorou e a primeira namorada beijou. Agora é só memória.

Nessa hora de dor e saudade, importa não esquecer também o inspirado assobio que o "poeta bakongo" buscou do ámago, num momento de reflexão, para esquecer os seus pensamentos, os amores, as tristezas da vida e tudo quanto não pode dizer, claramente, num período em que o país era disputado, pela via das armas, por irmãos desavindos.

O luto pelo seu passamento físico é geral, abrangendo velhos, jovens, crianças, políticos, governantes, deputados, académicos, homens de arte (...). Todos, de Cabinda ao Cunene, perderam um revolucionário, um irmão que sofreu amarguras na diáspora, como exilado, do qual não mais ouvirão os contos e provérbios de Mbanza Kongo.

Com a sua morte, Angola perde o "direito" de saborear o funge de domingo à sombra da mulemba, como fazem os velhos das sanzalas, sem evocar esse ilustre homem de arte, que deixa um válido conselho aos compatriotas: falar e projectar a terra mãe à maneira do mesmo, esquecendo-se da guerra, tendo uma só voz e ficando entre irmãos.

A nação deve derramar choros sinceros, como o da "Avo Ximinha" musicada por Teta Lado, pois, só assim o artista saberá compreender a razão de ter partido tão cedo, do mesmo jeito como fez entender os seus antepassados quando o ouviram cantar, mesmo ausentes fisicamente, o célebre tema "Reunir (Funge de Domingo)".

Como compositor, musicou a vida na sanzala, a beleza da mulher negra que se via incomodada pelos cabelos (carapinha) duros, e o amor pela pátria, sugerindo, num período crítico da cena política nacional, caminhos viáveis que pudessem assegurar a reconciliação entre irmãos desavindos, sem distinção de cores, raças e condição social.

Partiu a sua veia de compositor, os ensinamentos e os cabelos brancos de sabedoria, mas ficou, na mente de cada angolano, a marca melódica desse defensor de massas.

O adeus já é inevitável. Mas ficará para sempre o grito nacionalista de Teta Lando que, mesmo vivendo na condição de exilado, em Portugal, jamais abriu mão das suas raízes, do amor pela pátria e do lado crítico que fez dele um intérprete de "mão cheia".

O momento é de acção e não bastam elogios, pelo que tudo deve ser feito para dar seguimento ao legado por ele deixado, valorizando as convicções, os anseios, as expectativas de um homem culto, que recorreu à música para esquecer os pensamentos.

Por: Elias Tumba

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